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13/08/2025  - TJRS: Primeira jurada surda faz história no Tribunal do Júri do Rio Grande do Sul
 
TJRS

Era para ser mais um julgamento na 4ª Vara do Júri de Porto Alegre, especializada em feminicídios. Mas, entre os sete cidadãos e cidadãs sorteados para decidir o caso, havia uma presença inédita: pela primeira vez, uma pessoa surda participou como jurada de um júri popular no Rio Grande do Sul.

A protagonista dessa história é uma professora de 45 anos. Ao receber a convocação em casa, das mãos de uma Oficiala de Justiça, ela não pensou duas vezes antes de aceitar. "A pessoa surda tem possibilidade de estar participando de qualquer ambiente, assim como qualquer outra pessoa", afirmou.

Na manhã desta terça-feira (12/08), ela assumiu seu lugar no Conselho de Sentença e viveu uma experiência marcante. "Me senti bem. Foi um desafio para mim, nunca tinha participado de uma experiência assim", contou. No começo, veio o nervosismo, mas a presença de três intérpretes de Libras — Luciana Côrte Real, Maria Aparecida da Silva e Ariadne Panziera — trouxe segurança e confiança, assegurando a plena compreensão de todas as etapas do julgamento.

"Qualquer pessoa tem o entendimento da responsabilidade que demanda essa participação. Não é só estar ali julgando de forma simples, mas é preciso entender o contexto do que será julgado, ter discernimento de tudo, é muita responsabilidade. E também entender que temos que entrar aqui de forma neutra para conseguir julgar o que aconteceu de fato. Qualquer pessoa da sociedade pode estar participando e tem direito", completou a jurada.

Preparação para a inclusão

A participação foi possível graças ao planejamento da Juíza Cristiane Busatto Zardo e da equipe da 4ª Vara do Júri, com apoio da Corregedoria-Geral da Justiça (CGJ), do Núcleo de Inclusão, Acessibilidade e Diversidade (NIAD) e da Comissão Permanente de Acessibilidade e Inclusão (CPAI) do Tribunal de Justiça. “Ela exerceu a função de jurada com responsabilidade, competência e tranquilidade”, elogiou a magistrada.

O Juiz-Corregedor Bruno Massing de Oliveira, Coordenador da CPAI, explicou: "O caso da 4ª Vara do Júri chegou até nós através da magistrada, que informou que havia uma pessoa surda convocada, que poderia ser sorteada para participar dos plenários do mês de agosto. No júri de hoje, ela acabou sendo sorteada, não houve recusa das partes, e ela compôs o Conselho. É preciso enaltecer o trabalho realizado pela magistrada e toda a equipe da 4ª Vara do Júri, que possibilitou que a jurada entendesse e participasse efetivamente dos trabalhos, por meio de intérpretes de Libras. Foi uma atitude de muita inclusão".

Para a Chefe do NIAD, Ane Py Machado, "a participação de uma jurada surda com intérprete de Libras em um Conselho de Sentença representa um marco na efetivação da cidadania e da igualdade previstas na Constituição e na Lei Brasileira de Inclusão, garantindo que pessoas surdas exerçam plenamente seu papel cívico no sistema de justiça. Além de assegurar acessibilidade e representatividade, essa inclusão quebra barreiras comunicacionais e combate preconceitos, mostrando que a diversidade enriquece as decisões coletivas e fortalece a legitimidade do Tribunal do Júri como expressão da pluralidade social".

O julgamento

O caso julgado foi uma tentativa de feminicídio qualificado. Segundo a acusação, em 2020, o réu — julgado à revelia por estar foragido — teria ateado fogo na ex-companheira. A vítima sobreviveu ao ataque, mas já faleceu. Ao final, ele foi condenado a oito anos de prisão em regime inicial fechado.

Durante a sessão, a jurada recebeu o material do processo impresso e contou com interpretação simultânea em Libras. As intérpretes se revezaram para garantir o acesso pleno às informações. Luciana Côrte Real, que já é uma intérprete experiente, considerou o momento especial. "É uma experiência nova e muito importante, que reforça o papel da inclusão no Judiciário". Ela contou que a jurada "achou muito interessante e ficou surpresa com todo o cuidado e sensibilidade da Justiça para garantir sua plena participação".

A intérprete Maria Aparecida ficou emocionada: "não tenho como descrever. Foi um desafio diferente para mim, mas que achei maravilhoso. Um júri com inclusão, isso é muito importante para nós". Ariadne, que também é Policial Penal, completou: "Estou muito honrada de estar presenciando mais uma inclusão dentro de um espaço próprio da comunidade".

Um gesto de coragem

A Juíza Cristiane Zardo contou que, no momento do sorteio, não se sabia da deficiência auditiva da jurada. Quando a Oficiala de Justiça foi até a residência dela, explicou que poderia ser dispensada, se quisesse. "Mas ela queria exercer o seu papel de cidadã e invocou a lei da acessibilidade", lembrou.

"A decisão de participar foi muito corajosa. Fico muito feliz dela ter tido a oportunidade de exercer a cidadania nesse júri e orgulhosa do nosso Tribunal ter feito de tudo para que isso fosse possível", acrescentou a magistrada.

A Promotora de Justiça Luciana Cano Casarotto exaltou a presença inédita. “Ter uma jurada surda no corpo de jurados é motivo de grande orgulho. Em um julgamento de feminicídio, é essencial valorizar a sensibilidade de toda a comunidade, inclusive das pessoas com deficiência. O esforço do TJRS para garantir essa participação é motivo de alegria, e o Ministério Público seguirá incentivando que mais pessoas se sintam encorajadas a cumprir esse dever constitucional, com a certeza de que terão as condições necessárias asseguradas.”

O Defensor Público Gabriel Luiz Pinto Seifriz destacou os cuidados para garantir os direitos de todos. “A inclusão é fundamental, mas no júri, que tem a oralidade como princípio, é preciso garantir que tudo seja feito dentro da legalidade, preservando os direitos das pessoas que estão sendo julgadas. Todas as cautelas necessárias foram tomadas para que a participação da jurada não comprometesse a imparcialidade ou a plenitude de defesa do acusado”.

Mais do que um fato inédito, a presença da jurada surda no Tribunal do Júri reforça que inclusão e representatividade são práticas que fortalecem a democracia e aproximam a Justiça de toda a sociedade.

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