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02/09/2014  - O Plenário do Júri não é altar de autocomiseração do réu culpado. A vítima existe!
 
Matheus Macedo Cartapatti – Promotor de Justiça de Iguatemi\MS

“O CADÁVER. O cadáver é meu. Os órfãos são meus. O luto e a dor pertencem à acusação. Atacar a vítima é profanar cadáver. É crime. Senhores jurados: se a honra de seu compromisso se desfalecer ante a exploração barata do sentimentalismo, então Vossas Excelências elevem o coração e escutem as lamentações de quem já não pode se defender” - Roberto Lyra

Estratégia hipócrita e encontradiça das defesas, no transcurso da fase do juízo da causa, no bojo do procedimento dos crimes dolosos contra a vida, é a tentativa de revestir a historiografia do réu (sobre o qual pesam elementos de prova a ensejar a condenação) com capítulos sacrossantos que, ingeridos goela abaixo pelo jurado piedoso, são aptos a criar a figura cândida de um anti-herói vítima da fatalidade de um acaso destituído do exercício do livre-arbítrio. Pura hipocrisia; ademais, ao lançar mão de tal argumento de piedade indevida, a defesa parece, oportunamente, esquecer, revelando dois pesos e duas medidas, de um dos mais bradados postulados do garantismo megalomaníaco, o direito penal do fato. A fim de coibir a nefanda tática de impunidade, há necessidade premente de o Promotor de Justiça se conscientizar de que, por meio da sustentação da pronúncia, a vítima de um ato injusto contra a própria vida “fala” pela última vez e o direito penal exige aplicação de rigor contra o malfeitor do principal direito individual indisponível.

A garantia constitucional da plenitude da defesa, prescrita no inciso XXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, não é absoluta. Submete-se ao postulado da cedência ponderada entre as liberdades públicas indisponíveis; em especial, quando vai de encontro com o direito subjetivo de viver sem que criminosos obstem, injustamente, tal fruição. No entanto, sob o pálio da hipertrofia alucinada da presunção da não culpabilidade, já em fase final do procedimento bipartido (juízo da causa), e de argumentos extralógicos de piedade hipócrita, a defesa técnica costuma “expelir” um vomitório de idiossincrasias do tipo: “o réu é trabalhador”, “o réu tem família”, “momentos de arroubo podem acontecer com qualquer um”, “encaminhar um homem de bem para a prisão seria um equívoco do valor justiça”, “o réu tem tantos filhos para criar”, “o réu participa de intentos de caridade”, ou seja, o réu seria a materialização da Santa Trindade. Balela pura, como já disse a personagem Brás Cubas da obra realista de mesmo nome de Machado de Assis, no capítulo IV: “Quem não sabe que ao pé de cada bandeira grande, pública, ostensiva, há muitas vezes várias outras bandeiras modestamente particulares, que se hasteiam e flutuam à sombra daquela, e não poucas vezes lhe sobrevivem? Mal comparando, é como a arraia-miúda, que se acolhia à sombra do castelo feudal; caiu este e a arraia ficou. Verdade é que se fez graúda e castelã”(1). Ora, neste momento, como em um súbito furto de memória, os paladinos laxistas se esquecem do direito penal do fato e criam elementares típicas inexistentes nos preceitos primários das normas previstas no capítulo I do Título I do Código Penal; com o único objetivo de ludibriar o Conselho de Sentença com vistas a fazer o réu virar vítima e a vítima real virar ré. Por fim, como é praxe da defesa em plenários, os mesmos que defendem a aplicação fundamentalista da plenitude da defesa, presunção de não culpabilidade e direito penal do fato, serão os que farão de tudo para achincalhar a imagem da vítima que perdeu a vida de forma criminosa, no afã de inocentar o “franciscano” homicida.

Há velhas lições que estão esquecidas e precisam voltar a serem lembradas com altivez pelo Promotor de Justiça que sustenta no júri a condenação do réu contra o qual depõem elementos de prova irrespondíveis. Independente do passado heroico ou caridoso do réu, independente de o homicida ter trabalho ou prole, se matou injustamente, a Constituição Federal, o Código Penal, a legalidade e a democracia exigem responsabilização penal severa. Como dito por Nélson Hungria: “o homicídio é o tipo central dos crimes contra a vida e é o ponto culminante na orografia dos crimes. É o crime por excelência. A mais chocante violação do senso moral médio da humanidade civilizada, é o padrão de deliquencia violenta ou sanguinária, que representa como que uma reversão atávica às eras primevas, em que a luta pela vida, presumivelmente, se operava com o uso normal dos meios brutais e animalescos.” (2)

Infelizmente, com o passar dos lustros, a invariante axiológica da vida é banalizada cada vez mais. O ato ceifar a vida do ser humano de forma criminosa e injusta já não gera a mesma indignação de alhures. É preciso reverter esta tendência, a vida é a barreira intransponível de qualquer argumento garantista superdimensionado e da hipocrisia do coitadismo penal, o qual tenta negar a responsabilidade do homem pelo exercício ilegal do livre-arbítrio. O Ministério Público tem que defender com extrema bravura a vida, sem esmorecer, com diligência, destemor e paixão pelas cores vermelhas da beca; afinal, aceitem ou não os falsos humanistas, a vítima real pede justiça pela última vez por meio do membro do Parquet.

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Notas:

1- ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Editora Ática, 1996, pág. 21.

2 - BONFIM, Edilson Mougenot. No tribunal do júri. Crimes emblemáticos. Grandes julgamentos. 4ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, pag. 69.

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